O périplo internacional da nossa família começou em 1994, quando nos mudamos para a cidade do México, acreditando que ficaríamos só dois anos longe do Brasil. Acabamos ficando catorze. Nossos dois filhos nos acompanharam em alguns momentos. Em outros levaram suas vidas independentes, longe dos nossos olhos, numa longa trajetória pontilhada de incontáveis despedidas e reencontros.
Remexendo nas gavetas, acabo de encontrar esse texto que Bebel escreveu em 1997, quando ela cursava Engenharia em Boston, Estados Unidos, enquanto nós, seus pais, vivíamos do outro lado do mundo, na pequena ilha de Cingapura, Sudeste Asiático.
Hoje, na contagem regressiva dos dias que faltam para seu retorno ao Brasil, a releitura deste texto escrito há quinze anos me faz refletir emocionada sobre a importância da proximidade física com nossas pessoas queridas.
Longe dos meus pais
Cabelo molhado, pé no chão, jantar na cama ao
som da TV. Olho para os lados e não há ninguém falando de gripe, de meias, nem
de comida na mesa. Minha primeira reação é rir. E rio de mim mesma: deste
retrato de uma típica adolescente que mora longe dos pais. No entanto, percebo
que meu riso já não carrega a energia de quem conquistou a independência. É um
riso meio envergonhado de assumir que eu ainda preciso de colo.
Há mais de dois anos moro sozinha em terras
estrangeiras. Meu primeiro ano de “liberdade” me contaminou com a beleza do
voar livre e solta. Voei sem medo de altura, sem medo de me perder. Com o
tempo, fui criando um medo de voar só, um medo inesperado que brotou junto com
o começo de uma vida adulta. De repente, minhas asas estavam pesando toneladas
e senti novamente a necessidade de voltar para o aconchego dos braços dos meus
pais. Precisava lhes perguntar sobre essa dor nas asas, sobre essa sombra de
tristeza que começava a me seguir. Mais do que respostas, eu precisava era da
mágica companhia deles. Só que dessa vez eles estavam longe, tão longe, que
para chegar até eles e voltar aonde estou daria uma volta ao mundo. Meus pais
moram em Cingapura e eu ainda estou me acostumando com a idéia de que todas as
vezes em que eu precisar de colo, terei e-mails, cartas e/ou telefonemas.
Cingapura é muito mais do que um país
pequenininho perdido na imensidão do continente asiático. É um país que hoje em
dia tem duas pessoas maravilhosas caminhando por suas ruas. E, de longe, vivo com
a incoerência de meus pensamentos. Meu lado emocional é egoísta e chorão, se
sentindo fraco e pobre por não tê-los por perto. Sinto que ainda preciso do
apoio diário dos dois para que eu consiga superar a transição para essa nova
fase da minha vida. Por outro lado, meu “eu” racional sorri tranquilo e grato
por meus pais estarem vivendo uma vida saudável em um país seguro, estável,
perto de culturas exóticas e em clima tropical.
Esta vida banhada em saudades ainda me tem de
aprendiz. Sei que ninguém consegue se esconder da tristeza da distância, mas
também sei que o amor que une uma família vai além do silêncio e da falta do
toque. E é de longe que eu choro com eles, que a gente ri e que a gente forma
uma família que eu não troco por nada. E é também de longe que eles me passam a
energia para eu cuidar de mim mesma… E já vou secando meus cabelos, colocando meia no
pé, apagando a TV, arrumando a cama para uma outra noite de sono… E assim que fecho
meus olhos, penso neles abrindo os seus e preparando-se para começar o dia que
para mim ainda é amanhã.
18 comentários:
Sem palavras,apenas um engasgo na garganta em uma mistura de emoções. Bebel, bem vinda de volta no colo da sua família. Monica e Gadelha, aproveitem bastante a filhota de volta ao lar. Beijos. Lia
Mónica,
obrigada por esta deliciosa partilha...
A vida é assim mesmo. Partidas e retornos. E assim se aprende.
Imagino o seu coração alegre , o sorriso que lhe conheci,nesta expansão de alegria anunciada.
Do Rio, já tenho saudades também. Beijo amigo e saudades
Ana
Antes de mais nada, bem vinda Bebel, a terras brasileiras.
E parabéns por esta alma inspirada que, certamente, herdou de sua mãe, que tambem vê o mundo a sua volta com lentes mágicas.
Espero breve poder compartilhar com voce o maravilhoso clima da serra de Itaipava. :)
I read Bebel's words with tears in my eyes ..remembered letters that Ayse wrote when she also was in Boston .."I still have my room at our home dont I?" "here nobody worries about me" I am so happy for you ..good luck Bebel and bem vindo..
Minha nossa!!!!
Que clareza, e sensibilidade em relatar os conflitos emocionais e racionais de todos os adolescentes que deixam os seus ninhos para o primeiro voo solo...
Monica posso imaginar como deves estar com coracão cheio, na espectativa de espera-la, de arrumar o quarto, preparar a geladeira com as guloseimas, chamar os amigos e festejar este retorno.
Parabéns para Bebel, e pra todos da family.
Sucesso pra filhota nas terras de origem
Grande beijo
Bebel, linda, adoro você!
Que texto lindo e doce. Como você escreve bem!! Duro mesmo esta contradição do desejo de autonomia X necessidade de amparo. Você desceveu da maneira perfeita. Amei!
Feliz pela família toda e ainda mais por você que é tão apaixonada e dedicada à cultura brasileira. Você vai ter muito trabalho a fazer por aqui. Benvinda querida!!
I don't know what I liked better, the news or the beautiful writing. What an artistic team! and now reuniting...
I am very happy for the whole family. Much happiness to all of you!
Beijinhos e saudades.
Querida Monipin, quando as inúmeras tarefas ocupam sem parar o pensamento, os sentimentos ficam temporariamente de lado. O que não terão sido os momentos seguidos à repentina separação? Creio que a saudade - de ambos os lados - deve ter cortado os corações...
Que bom, agora, experimentadas essas ausências sentidas, pais e filha, irão sentir com maior intensidade o calor da presença recíproca!!!
Monipin, sua filha tem muito de você: já me cativou pelo dom da palavra!!!! Teruko Monteiro
Monica,
Na linda "Back in Bahia" Gil diz: "Hoje eu me sinto como se ter ido fosse necessário para voltar / Tanto mais vivo de vida mais vivida / Dividida pra lá e pra cá". Penso que assim a Bebel voltará: mais viva de vida vivida. E que lindas palavras ela usou para embalar a saudade dos pais. Emoção pura!
Abs, Tarlei
Pura emoção, mil sentimentos me invadem ao ler estas linhas da filha querida. Aqui exponho um deles: meu imenso desejo de que ela seja muito feliz.
Que tenha um ótimo retorno! amei o texto....
putz! bateu ainda mais saudades da minha mana!
Queridos. Que bonito o que foi dito pela Bel, que bom ter agora a filha de volta. Acho que para vcs vai ser uma experiência nova, depois de tanto tempo.
É com votos de felicidades que eu desejo à todos um excelente regresso. Bjs. Beth van Berg
Monica, pela minha experiência e a de outros que conheci e que como eu decidiram voltar a viver no Brasil, o que ocorre em geral é que a decisão de voltar é amadurecida depois de muita reflexão para poder acabar com a saudade crônica da família, do clima, da comida, dos amigos e da terra natal.
É uma decisão difícil porque o Brasil ainda tem muitos problemas para quem se acostumou com as coisas funcionando lá fora.
Mas quer saber a verdade? Eu nunca ouvi ninguém que tenha se arrependido dessa decisão.
Sucesso para ela!
Parabéns para ela que foi muito forte apesar da saudade.
Felicidades para todos no seu retorno.
Monica, obrigada por dividir conosco as palavras da sua filha. Fiquei emocionadissima quando li o texto.
Parabens pela filha e familia que mora no nosso coracao.
Então Mónica,
para quando um belo de um texto sobre a emoção "da filha de volta"????
Abracinho amigo e saudoso de terras do sul do atlântico...
Ana
Olá.
Seu blog é muito legal,conteúdo interessante e muito bem escrito.
Parabéns.
Até mais
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